Instrução Trabalhista

Instrução Trabalhista

Na instrução, as provas serão apresentadas pelas partes e livremente avaliadas pelo magistrado (art. 371 do CPC/2015),
independentemente de quem as tiver produzido. As provas, por conseguinte, são comuns e indivisíveis. Eis os princípios da
comunhão e da indivisibilidade das provas. Elas pertencem ao Estado-Juiz. O advogado tem que levar em conta essa
característica antes de requerer a produção de uma determinada prova, pois, depois de apresentada, não adianta alimentar a ideia
de que o juiz só levará em conta o fragmento que “favorece” o seu cliente.
O juiz é o destinatário das provas, utilizando-as para alcançar a sua persuasão (convencimento).
O juiz também pode “produzir” provas, afinal ele tem ampla liberdade na condução do processo, podendo determinar a
realização de qualquer diligência necessária ao esclarecimento dos fatos. Ao juiz cabe também a decisão de indeferir
requerimento de produção probatória (oitiva das partes, de testemunhas, realização de perícia etc.). Sempre é importante
destacar que as decisões judiciais devem ser fundamentadas, sob pena de nulidade, nos termos do inciso IX do art. 93 da CF e
do art. 11 do CPC/2015. O comando do juiz, no que diz respeito à determinação das provas necessárias, está esculpido nos arts.
765 e 852-D da CLT e 370 do CPC/2015.
A atuação do magistrado, na condução do processo, fica restrita aos limites da lide – arts. 141 e 492 do CPC/2015.
No processo trabalhista, feito o pregão e comparecendo as partes, o juiz tentará conciliar o litígio, como prevê o art. 846 da
CLT. Não sendo possível a conciliação, o reclamado apresentará a sua defesa, como dispõe o art. 847 da CLT. Terminada a
defesa, seguir-se-á a instrução processual, nos termos do art. 848 da CLT.
A CLT, como já estudamos, foi construída sob a égide da audiência una. O citado art. 848 da CLT decreta:
Art. 848 da CLT. Terminada a defesa, seguir-se-á a instrução do processo, podendo o presidente, ex officio ou a
requerimento de qualquer juiz temporário, interrogar os litigantes.
Observem que a redação ainda se reporta à antiga constituição da primeira instância, chamada de “Junta de Conciliação e
Julgamento”. A “Junta” era constituí- da de três juízes, um concursado, chamado de “togado”, e dois “classistas”, que eram
“temporários”. Com o fim da representação classista, no ano de 1999, mediante a EC 24, o juiz do trabalho passou a atuar
monocraticamente, razão pela qual as “Juntas” deram lugar às “Varas do Trabalho”. Não se fala mais em “presidente”, mas em
juiz titular ou substituto.
A CLT não prevê, portanto, a suspensão dos trabalhos e a remarcação da audiência. Ela não trabalha com a clássica divisão
da “audiência inicial” e da “audiência de instrução”. Essa fragmentação, porém, como já analisamos, é comum no rito ordinário.
Tornou-se tão corriqueira a ponto de o TST publicar as Súmulas 09 e 74, verbis:
SÚMULA 09 do TST. AUSÊNCIA DO RECLAMANTE. A ausência do reclamante, quando adiada a instrução
após contestada a ação em audiência, não importa arquivamento do processo.
SÚMULA 74 do TST. CONFISSÃO.
I ‒ Aplica-se a confissão à parte que, expressamente intimada com aquela cominação, não comparecer à
audiência em prosseguimento, na qual deveria depor.
II ‒ A prova pré-constituída nos autos pode ser levada em conta para confronto com a confissão ficta (arts. 442 e
443, do CPC de 2015 ‒ art. 400, I, do CPC de 1973), não implicando cerceamento de defesa o indeferimento de
provas posteriores.
III ‒ A vedação à produção de prova posterior pela parte confessa somente a ela se aplica, não afetando o
exercício, pelo magistrado, do poder/ dever de conduzir o processo.
Infelizmente, a exemplo de muitos atos processuais, não há, na Justiça do Trabalho, uma padronização capaz de assegurar
o mínimo de segurança jurídica aos litigantes e advogados.
Essa “miscelânea procedimental” é fruto da falta de um Código de Processo do Trabalho.
O art. 848 da CLT deixa a entender que o interrogatório das partes é uma mera faculdade do magistrado, bem diferente da
previsão do art. 385 do CPC/2015, que espelha norma mais moderna, facultando ao litigante o requerimento para que seja
colhido o depoimento pessoal do outro. Essa diferença, evidentemente, gera uma acirrada discussão, pois há quem diga que a
CLT deve ser prestigiada, sob o fundamento de inexistência de omissão (art. 769 da CLT), assim como há quem prestigie a
previsão do processo comum, por considerar o depoimento pessoal como típico meio probante. Sigo esta última corrente,
reconhecendo a força do interrogatório, que pode gerar a rainha das provas: a confissão expressa. Não por acaso, o CPC/2015
inseriu o depoimento pessoal no Capítulo das Provas, cuidando, logo em seguida, da confissão (Capítulo XIII – Seção IV e
Seção V).
Observem que não estamos discutindo se o juiz é obrigado ou não a colher os depoimentos de reclamante e reclamado.
Não se trata disso, já que o juiz é livre para, mediante decisão fundamentada, especificar as provas necessárias para o
julgamento da demanda. Discute-se apenas o direito de o advogado requerer ou não a oitiva da parte contrária. Só isso.
Bom, já estudamos que a ausência do reclamante à audiência gera o arquivamento da reclamação, enquanto que a ausência
do reclamado gera a revelia e a confissão ficta quanto à matéria fática – art. 844 da CLT. Esses efeitos são aplicados à audiência
una e à “audiência inicial”.
A ausência das partes à “audiência de instrução”, nas varas que trabalham com o fracionamento da sessão, não vai gerar
nem o arquivamento, nem a revelia. O efeito, no caso, será o mesmo para ambas as partes: “confissão ficta quanto à matéria de
fato”.
A ausência de uma das partes à “audiência de instrução” traduz a sua recusa em prestar depoimento pessoal, atraindo,
assim, a incidência do art. 385, § 1º, do CPC/2015. O TST cuida do assunto na Súmula 74.
Aplica-se a confissão à parte que, expressamente intimada com aquela cominação, não comparecer à audiência de
instrução – item I da Súmula 74 do TST.
A confissão ficta, portanto, incidirá tanto sobre o reclamante, como sobre o reclamado. Ambos sofrerão a mesma “pena”.
Para que isso ocorra, é imprescindível que a parte tenha sido intimada (avisada, alertada) de que a sua injustificada ausência
geraria a aplicação da “pena”. Sem a intimação prévia (aviso, alerta), não há como o juiz aplicar a “sanção”.
O advogado deve sempre checar se na “ata de audiência inicial” consta, no final, essa advertência. Geralmente ela diz:
As partes deverão comparecer pessoalmente à próxima audiência, para depoimento pessoal, sob pena de confissão.
Já vi acontecer de uma das partes não comparecer à audiência de instrução e o juiz, sem perceber que na ata da audiência
anterior não tinha constado a “advertência”, aplicar a pena de confissão ficta e marcar a data para a prolação de sentença. O
advogado da parte ausente à audiência, antes da sentença, peticionou requerendo a reconsideração da decisão de aplicação da
“sanção” e de encerramento da instrução, mostrando ao magistrado que a parte não poderia ser considerada confessa quanto à
matéria fática, pelo fato de não ter sido advertida desta cominação, lastreando o requerimento no item I da Súmula 74 do TST e
no § 1º do art. 385 do CPC/2015. O juiz reconsiderou a decisão e os atos processuais foram declarados nulos, retornando o feito
à pauta de instrução (retorno ao status quo ante) – inteligência dos arts. 794 e 797 da CLT.
Se ambas as partes não comparecerem à “audiência de instrução”, tornar-se-ão confessas quanto à matéria fática.
Significa dizer que o reclamante estará confessando que os fatos narrados pelo reclamado, na contestação, são verdadeiros
e que, concomitantemente, o reclamado também estará confessando que os fatos narrados pelo reclamante, na petição inicial,
são verdadeiros. Como poderá o juiz decidir, já que os litigantes, mutuamente, confessaram? Simples. O magistrado utilizará,
para o seu veredicto, a teoria do ônus da prova, tão bem definida no art. 373 do CPC/2015. Caso o ônus da prova seja do
reclamante, sua será a sucumbência. Caso o ônus da prova seja do reclamado, a derrota o abraçará.
No mundo abstrato, pode até existir espaço para o compartilhamento do onus probandi. Mas no mundo real, aquele no qual
vivem juízes e advogados, o fardo probante de uma determinada pretensão sempre estará sobre os ombros de uma parte
específica, seja reclamante, seja reclamado.
O CPC/2015 inovou em matéria de ônus da prova, trazendo à baila a “distribuição equitativa e coerente do fardo
probante”, como pode ser observado no § 1º do art. 373. Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa
relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo probatório ou à maior facilidade de
obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão
fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
As lides envolvendo vínculo doméstico de emprego se encaixam muito bem na distribuição equitativa e coerente do ônus
da prova, pois, notoriamente, o empregado doméstico tem excessiva dificuldade de cumprir determinado encargo probante.
A terceirização envolvendo órgão público na qualidade de tomador de serviços é outro bom exemplo, pois o item V da
Súmula 331 do TST só admite a sua responsabilização subsidiária mediante comprovação de sua conduta culposa para a
inadimplência do fornecedor (o TST vinha aplicando, antes da chegada do CPC/2015, a esses casos de terceirização, a
“presunção de culpa do órgão público”, baseada na culpa in vigilando, mas essa tese contraria a decisão do STF exarada na
ADC 16, que declarou a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei 8.666/1993).
A priori, o ônus da prova é do reclamante (art. 818 da CLT e art. 373, I, do CPC/2015). Ele é quem está “acusando” o
reclamado de “fazer”, de “não fazer” ou de “não pagar”. Aprioristicamente, portanto, vai imperar a presunção de inocência, que
é um princípio constitucional. Não me venham falar do fantasioso princípio “in dubio pro operario”, criação daqueles que
“misturam” direito do trabalho com direito processual do trabalho. Existirá sempre o “in dubio pro litigante que não carrega o
fardo probante”. Eis como deve desaguar a incerteza, depois de esgotada a instrução processual.
O princípio da proteção ao hipossuficiente (empregado) é a alma do direito do trabalho. Com base nele, as normas
trabalhistas foram e são edificadas, na busca por contrabalançar uma relação jurídico-material historicamente desequilibrada – a
re- lação de emprego. O juiz do trabalho, principalmente na sua preparação para o concurso público, estuda o desenvolvimento
histórico da relação de trabalho, passando, inexoravelmente, pelo nefasto período da Revolução Industrial (principal fonte
material do direito do trabalho), com todas as suas mazelas. Em sua atuação processual, entretanto, o magistrado não deve
divorciar-se da imparcialidade. Não pode simplesmente “inverter o ônus da prova” com base na “hipossuficiência obreira”. Se
assim atuar, não estará atuando como juiz, mas como “justiceiro”. No direito processual, a relação envolve reclamante,
reclamado e juiz. Os litigantes têm direito constitucional ao “juiz natural”, que significa “juiz competente” e “juiz imparcial”. A
imparcialidade é um dever do magistrado. Sem ela, não há juiz natural. Sem ela, não há justiça.
Não há espaço, no direito processual, data venia, para qualquer “tese” capaz de arranhar a imparcialidade do
Estado-Juiz, tampouco para pirotecnias de inversão do ônus da prova. Juiz que “pende” para um dos lados,
ignorando as presunções legais e a boa técnica do ônus da prova, não é juiz, é justiceiro.
O alardeado “princípio” do “in dubio pro operario” desaba diante do sopro da boa técnica da teoria que distribui o fardo
probante, até mesmo pelo fato de, hodiernamente, reclamante e reclamado contarem com assistência de advogados. Está na hora
de exterminar, para sempre, a míope visão retrógrada de que o empregador já nasce marcado pela presunção de culpabilidade.
Esse fosco retrato é fruto de puro preconceito, destituído de alicerce científico. Os juristas devem lutar contra estereótipos,
afastando-se da vil discriminação.
Cultural a “perseguição” do Estado Brasileiro ao setor produtivo, ao empreendedorismo, àquele que deseja investir e gerar
empregos. Os órgãos públicos de fiscalização geralmente são implacáveis, incentivando o empreendedor a sair do país ou a
simplesmente guardar seu dinheiro no banco e viver “sem preocupação”.
Caso perdure, na mente do juiz do trabalho, no final da instrução, alguma dúvida, a sucumbência rastejará pelo caminho da
parte a quem cabia convencer o magistrado daquele “fato”, ou seja, “da parte a quem cabia o ônus da prova”, seja trabalhador,
seja empresa.
A mentira, o embuste, o sofisma e os subterfúgios não são uma exclusividade do empregador, como entendem alguns
aplicadores do direito, sob a influência da evolução histórica do direito do trabalho. Enxergar, independentemente do objeto da
ação, numa mesa de audiências, o empregado sempre como “vítima” é muito perigoso, pois essa postura pode privar o
magistrado da equidade necessária à justa condução dos trabalhos.

Trecho retirado do livro Manual de Audiência e Prática Trabalhista de Gustavo Cisneiros

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